Recentemente vi um artigo num jornal inglês em que o "jornalista" se indignava muito com a presença frequente de pessoas muito tatuadas, mais especificamente mulheres, no Royal Ascot (ao que parece, um evento chique de corridas de cavalos em Inglaterra). O autor do texto perguntava-se sobre como iriam estas mulheres viver no futuro, quando as tatuagens deixassem de ser cool, ou quando se apercebessem do "erro terrível" que tinham cometido na juventude.
Independentemente do que eu possa achar da opinião do jornalista, isto pôs-me a pensar no futuro. Não é só pelas tatuagens, mas na vida em geral, as pessoas da minha idade não pensam muito no futuro. Falo também por mim. E isso é que seria digno de um artigo, não uma opinião mesquinha de alguém que não vive bem com a estética dos outros (viverá bem com a sua?).
Não pensamos no futuro nem fazemos planos a longo prazo. O "viver junto", o casamento, os filhos são mais "coisas que acontecem" do que propriamente grandes planos de infância que se alcançaram com luta e esforço. As coisas não são tão planeadas como aqui há uns anos atrás, o futuro é esquecido. Porquê?
Alguns pais torturam-se com dúvidas e preocupações sobre quando será que o filho vai casar, ou a filha irá finalmente ter filhos. Talvez porque "no seu tempo" as coisas não fossem bem como agora. Vivemos uma época de instabilidade atroz, como eles também viveram (embora noutras circunstâncias, talvez ainda mais graves), mas com uma diferença: não há esperança.
Já se sobreviveu à ditadura, os tempos de felicidade e fartura já chegaram - são estes, os que se vivem agora. Este era o sonho que os nossos pais tinham quando, aos vinte e poucos anos, adiavam a decisão de ter filhos para "depois da ditadura". O depois da ditadura chegou (e ainda bem), mas entretanto as coisas não correram bem. E agora o futuro é novamente negro, com a agravante de termos em cima mais uma desilusão, o "fracasso" de Abril.
Concluindo, as tatuagens, alterações permanentes do corpo, têm um valor e um peso diferente nas mentes dos jovens/jovens-adultos dos dias de hoje. Porque o amanhã é uma incógnita total. Não é apenas a ideia de podermos levar com um camião na manhã seguinte, mas é uma incerteza generalizada em relação ao futuro: não sabemos se vamos estar vivos, ter emprego, reformas, comida, metade do conforto de agora... por isso toca a viver o hoje. Hoje somos imortais, porque o amanhã não existe.